sexta-feira, 24 de junho de 2011

A saudade me abate com toda força quando olho seu retrato.
Uma saudade que não tem tamanho, que não se justifica.
Porque não é saudade de um tempo que passou,
mas de um tempo que nem existiu.

E machuca saber que não dá mais.

Te levo comigo todos os dias
te lembro sempre que posso
pra não esquecer que fez parte da minha vida
mesmo que eu não tenha feito parte da sua.

E machuca saber que não dá mais.

Machuca demais.

domingo, 19 de junho de 2011

Soneto XLIV

Saberás que não te amo e que te amo
posto que de dois modos é a vida,
a palavra é uma asa do silêncio,
o fogo tem uma metade de frio.

Eu te amo para começar a amar-te,
para recomeçar o infinito
e para não deixar de amar-te nunca:
por isso não te amo todavia.

Te amo e não te amo como se tivesse
em minhas mãos as chaves da fortuna
e um incerto destino desditoso.

Meu amor tem duas vidas para amar-te.
Por isso te amo quando não te amo
e por isso te amo quando te amo

------------------------------------------
*Cem Sonetos de Amor - Pablo Neruda

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Internet (ou You've Got Mail)

Este texto é um parênteses do texto anterior (Telefone).

A internet é uma coisa poderosa, dominadora. Praticamente substitui o telefone. Praticamente. Porque você pode estar conectado a um programa de bate-papo, junto com várias pessoas que você conhece, e não falar com nenhuma delas. Você sabe que elas estão ali, e isso te consola. Mas não significa que vai realmente falar com elas. Ou que elas vão falar com você. A menos que se tenha muitos assuntos com uma pessoa, todos os dias, o tempo todo, você só vai falar com ela o extremamente necessário. Mais ou menos como o telefone. Só que o telefone já deixou de ser um meio facilitador de conversas. Só se utiliza o telefone quando é extremamente necessário falar com alguém sobre algum assunto específico. Hoje em dia todo mundo tem celular, mas eles tocam cada vez menos. As pessoas se comunicam cada vez mais por escrito - SMS, e-mails, bate-papos da internet - do que por voz (a não ser as pessoas que usam programas como Skype, mas eu não conheço ninguém que faça isso com regularidade). A menos quando se encontram fisicamente.

É quase como voltar no tempo. A diferença é que as pessoas passam grande parte do tempo sentados na frente de um computador, e não numa escrivaninha escrevendo cartas à mão. O problema do computador é que as respostas são imediatas. E você tem que ficar na frente dele escrevendo e respondendo infinitamente. A vantagem das cartas é que você tinha que esperar até o destinatário responder. E enquanto se esperava, tanta coisa podia ser feita: passeios no parque, leituras, trabalho atrasado... tanta coisa! Mas ficamos trancados, em casa, na frente de uma tela mágica. Socializando no mundo virtual em vez de socializar no mundo real. Para alguns as redes sociais são um meio de acabar com a solidão. Pra mim é justamente o contrário. Fico pensando o quanto poderia aproveitar melhor se não estivesse em casa comendo chocolate e me afogando (em vez de surfando) na internet.

Mas no fim, a gente sempre escolhe o caminho mais fácil. Melhor apostar na certeza frágil de uma companhia distante que na incerteza de um laço forte e verdadeiro no mundo que existe fora da gente. É tão confortável viver dentro da gente. Mas sei que não é a maneira mais corajosa de se viver. E sem dúvida é a mais solitária.

Já esqueci porque escrevi tudo isso. Acho que eu só estava solitária e resolvi lançar esse texto no vazio, sem a mínima pretensão ou o desejo de receber uma resposta. Então, até mais tarde, vazio.

Telefone

Me ligaram esses dias e eu não estava em casa. Não deixou recado, nome ou telefone pra ligar de volta. Quem me avisou disse que a pessoa ligaria de volta e tinha voz de menina, devia ser uma amiga. Mas não ligou de volta. Nem tentou o celular. E nenhuma amiga me procurou desde então pra dizer alguma coisa. Uma coisa tão importante que ela se incomodou em ligar pra minha casa - porque hoje em dia as pessoas de 20 anos não usam o telefone pra falar com os amigos, a internet existe pra isso.

Mas em algum lugar eu tenho uma amiga que ainda liga pra minha casa pra falar comigo. E se esquece de retornar a ligação. Talvez o assunto não fosse importante. Mas eu teria ficado feliz de falar no telefone com alguém, pra variar.

Como fiquei agora, ao receber um telefonema de uma amiga identificada no celular. Só queria me pedir um favor. Mas eu falei com ela com um sorriso pendurado de orelha a orelha. E é este sorriso que vai me sustentar ao longo de um dia solitário.

Mas quem é realmente solitário quando se tem amigos?