domingo, 19 de setembro de 2010

Duas histórias

Chovia. As gotas geladas castigavam o vidro da janela, que tremia com o vento forte que gritava lá fora. Mas ele não ligava. Dentro de casa ele sorria. Contemplava feliz as palavras que escrevera no papel. Finalmente. Ali estavam os mais belos versos que alguém jamais poderia ter escrito. Ele dedicara-se fielmente à escrita daquele poema, dia e noite. Não comera, não dormira, não fizera mais nada enquanto trabalhava naqueles versos. Mesmo durante as aulas. Tudo para se dedicar à sua obra prima. A primeira de muitas. E a mais especial de todas porque tivera a melhor fonte de inspiração que se pode imaginar para escrever aqueles versos. O poema estava perfeito. Tudo seria perfeito. Ele não via a hora de mostrar a ela o fruto de seu árduo trabalho. Ela ficaria orgulhosa, ele sabia. Ela leria suas lindas palavras, abriria aquele sorriso iluminado e lhe daria um grande abraço, e depois o tão esperado beijo. Chovia. Mas ele não se importava. Ela tinha que ler o seu poema.
 
História 1:
 
Ele pegou o papel e guardou bem dobrado dentro da bolsa. Pegou a bicicleta e foi pedalando sob a chuva torrencial em direção à casa dela, o sorriso no rosto. Chegou, encharcado, tocou a campainha. Ela abriu, surpresa. Ele não falou nada, só estendeu a folha. Ela pegou, trêmula, e leu. Ele esperou. Ela o olhou, sorriu. Devolveu. Ele esperou. Ela olhou para baixo, receosa. Depois se inclinou e beijou-lhe o rosto gentilmente. Ele não entendeu. Lá dentro, uma voz masculina chamou. Ele olhou. A figura apareceu ao lado dela, abraçando-a. Ele entendeu. Baixou a cabeça, virou as costas, sentindo pela primeira vez o frio da chuva que ainda caía. Pegou a bicicleta e voltou para casa.
 
História 2:
 
Ele segurou o papel com as duas mãos, tremendo. Caminhou até a cozinha, onde ela estava em pé, fazendo alguma coisa. Ele puxou a barra da saia timidamente, ela virou-se e o viu. Ele estendeu a folha para ela, que leu. Ele esperou, ansioso. Ela o olhou, sorriu. E o pegou nos braços num aperto gostoso. Beijou-lhe a bochecha, como ele tanto havia sonhado. Depois pegou o poema e com dois ímãs fixou na porta da geladeira. Os dois foram até a sala e comeram bolo de chocolate. Melhor recompensa não tinha.

2 comentários:

Luiza . disse...

"(...)sentindo pela primeira vez o frio da chuva que ainda caía."

:)

Berriel disse...

foi tão bonito ler