domingo, 27 de março de 2011

A Chave

Com muito cuidado pegou a chavinha que carregava pendurada no pescoço, segurou-a forte contra o peito e respirou fundo. Em seguida, afastou um pouco do tecido da blusa e colocou a chave na fechadura, girando-a e abrindo a pequena portinha do seu coração. Cautelosamente foi tirando um a um dos residentes e colocando-as sobre a cama, as miniaturas de todos os seus amores passados.
Arrumou-os em fila por ordem cronológica. Os primeiros eram ainda menores que as outras miniaturas, seus amores de infância que ficaram para sempre crianças em seu coração. Sorriu com afago para os três rapazinhos e os colocou numa pequena caixa quadrada que estava ali perto e trancou à chave.

Depois vieram os amores da adolescência, o primeiro beijo, o primeiro namorado, o primeiro coração partido. Beijou cada um deles na pequena testa e os guardou dentro de outra caixa, um pouco maior que a anterior, em formato de coração, e novamente passou a chave.
E então foi a vez dos pequenos flertes e romances do início da vida adulta. Eram muito mais que apenas três. Passou os olhos por cada um deles, sorrindo e lembrando de cada um deles. Por fim, guardou-os numa caixa grande, redonda. Mas não trancou ainda.

Separou um e ficou olhando-o por longo tempo. Pensando. Se era cedo demais para retirá-lo de seu coração e guardá-los na caixa de lembranças para sempre. Pelo o que ela sabia, ainda era possível um envolvimento entre os dois. Mas será que valia a pena? Será que ela não devia seguir em frente e deixá-lo na velha caixa? Seria um peso a menos em seu coração fatigado. Era algo a se considerar.

Riu de si mesma. Não importava realmente se ela o colocasse na caixa ou não, o lugar daquelezinho em especial ainda estava bem demarcado em seu coração. A falta que ele faria ali seria um constante incômodo, talvez maior que a sua presença. Que não causava tormento, nem alegria, apenas uma adorável sensação de conforto e alívio. Decidiu. Era melhor deixá-lo onde estava.
Trancou a caixa redonda, pegou a miniatura que sobrava e a colocou de volta em seu coração, trancando-o novamente. Sentiu-se bem mais leve. Mas sem a triste sensação de um coração vazio.

Dali a algum tempo, outra miniatura de um amor passaria a ocupar seu coração. E a antiga seria guardada na caixa sem hesitação. Mas só dali a algum tempo.

Um comentário:

Dudu disse...

Que coisa mais linda!!! *.*

Adoro essas histórias assim! Vai ter continuação???